terça-feira, 1 de março de 2011

“O que me dá prazer mesmo, é a sintonia com a vida.”

Gonçalo Cadilhe faz da sua vida uma constante viagem, é um escritor viajante de profissão. “O Mundo é fácil” é o seu último livro; em breve será apresentado na nossa ilha.

Licenciado em Gestão de empresas, Gonçalo Cadilhe, abandonou o seu emprego e começou a viajar sozinho; da Figueira da Foz abriu as portas para o mundo e muitas noites o céu foi o seu melhor tecto, o mais bonito.
A par da sua carreira de viajante profissional, o Gonçalo, é músico e surfista.
Já colaborou com variadissimas revistas como a “Grande Reportagem”, a “Elle” e o “Independente”. Actualmente, colabora com o “Blitz”, a “SurfPortugal” e com o “Expresso”.
Em 2002, em 19 meses, realizou a sua primeira viagem à volta do mundo, tendo como opção: a recusa de transportes aéreos.


Depois de tantas viagens, onde é o seu lugar?
Sinto-me bem a trabalhar para mim, entusiasmado com as tarefas que me auto-proponho. Para um cronista de viagens, um projecto profissional significa andar pelo mundo. Diria que o meu lugar é em qualquer parte que resulte da minha vontade, da minha programação, dos meus estímulos intelectuais de estar lá. O meu lugar é o Estreito de Magalhães se o projecto for a biografia de Magalhães (que deu origem ao livro "Nos Passos de Magalhães"); ou então é uma estrada de pó no Congo se o projecto for atravessar o continente africano sem recorrer ao transporte aéreo (que deu origem ao livro "África Acima") ou o Laos e a Birmânia, se o projecto for revisitar os sítios descritos na Peregrinação de Fernão Mendes Pinto (que é onde me encontro agora (MARÇO/ABRIL)

Dá-lhe mais prazer: perder-se ou encontrar-se?
Ah ah, depende do que encontro quando me perco e do que se perde quando me encontro. O que me dá prazer mesmo é a sintonia com a vida, é estar no sítio certo no momento certo, essa coisa de olhar por acaso para um relógio digital e ver que as horas perfazem uma capíuca perfeita, tipo 14.41, e pensar que é o destino a piscar-me o olho. Imagine que frustração perder-me quando devia encontrar-me e vice-versa.

Qual o melhor de se estar perdido e o pior de se estar a encontrar?
E porque não o contrário? Ou seja: "Qual o pior de se estar perdido e o melhor de se estar a encontrar?". Tudo tem o seu lado positivo e negativo, a velha história do copo de agua meio cheio ou meio vazio. Tem a ver, repito, com termos ou não a noção que estamos em sintonia com a vida. É um estado mental.

“Não partir porque pode ser perigoso? Não, vai na mesma...”
O mundo é um animal domesticável? Se sim, qual o melhor truque para o domesticar?
O mundo, tal como a quantidade de sal na água da panela ou o lastro necessário para equilibrar o navio, controla-se melhor com a experiência. Ajudam bom-senso e intuição, mas só o tempo, os anos, os quilómetros, podem permitir essa certa tranquilidade de atravessar uma fronteira com um sorriso de antecipação. O truque é portanto, o tempo, a rodagem.

Comente esta citação: "Não temas aonde tens que ir, porque irás morrer onde deves."
É mexicana, vem dessa cultura com vários substratos e acoplamentos, uma cultura inaugurada de um modo trágico e sangrento, a rendição incondicional de um império meso-americano a meia dúzia de espanhóis barbudos só porque "estava escrito nas profecias". Essa dimensão de fatalidade, que é também muito portuguesa, pode ser útil para um aspirante a viajante se auto-convencer a enfrentar os perigos da viagem. Não partir porque pode ser perigoso? Nah, vai na mesma, se tiver que acontecer, tanto faz estares lá como teres ficado cá.

Onde gostava de envelhecer?
Num clima seco e ameno que não permitisse o avançar do reumatismo e das artroses (risos).

Qual a sua regra de segurança?
A minha regra básica de segurança, quer esteja a atravessar o Afeganistão, quer esteja a apanhar o metro em Nova Iorque, vem do bom senso popular: “Em terra onde estiveres, faz como vires fazer.

Cláudia Martins, IN Açoriano Oriental 21 de Fevereiro de 2011

1 comentário:

Fernando Santos (Chana) disse...

olá Cláudia, bela entrevista...Espectacular....
Beijos